Lá se vão 55 anos que Édio Nunes resolveu aceitar o convite inusitado de um amigo: “Eu havia ingressado na UFSC e minha atividade extra-curricular era outra, completamente diferente. Eu era atleta de competição, jogava futebol de salão e inclusive participava da seleção catarinense universitária. Não tinha qualquer relação com atividades culturais e de repente fui interpelado por um colega de turma para participar dos ensaios de uma peça teatral”. Em 1962, numa cidade conservadora como era Florianópolis, com uma visão de que quem fazia teatro não era gente séria, o convite bateu quase que como uma ofensa para ele. “Fiquei sabendo que cinco outros colegas da minha turma de calouros estavam participando do projeto e, então, resolvi dar uma conferida”, recorda. O grupo era o Teatro Universitário de Santa Catarina (TUSC) e a peça o clássico Auto da Compadecida de Ariano Suassuna.
Sem qualquer formação acadêmica na área teatral, Édio deixou a coisa ir evoluindo, a partir dos contatos com os companheiros e as companheiras mais antigos. “Aproveitei bem o início da minha formação, especialmente com uma pessoa chamada Odília Carreirão Ortiga, minha primeira diretora e grande mestra”, agradece.
De lá para cá, Édio já passou pelos movimentos teatrais do SESC, do SESI e do Clube 6 de Janeiro e pelos grupos O Dromedário Loquaz, A e Pesquisa Teatro Novo, até ajudar a formar o Grupo Armação ao qual está vinculado ainda hoje. Uma carreira com quase 50 espetáculos e entre os mais marcantes: Auto da Compadecida (1962), Está Lá Fora Um Inspetor (1975), Caminho de Volta (1976), Zumbi (1982), Os Órfãos de Jânio (1988) e Eu Confesso! (2014). No audiovisual, Édio já trabalhou com os principais cineastas catarinenses, já atuou em programas da RBSTV e na locução de trabalhos institucionais para gravadoras.
Nesses anos, o que não faltam são situações inusitadas e engraçadas para contar: “quando da montagem de Ato Cultural de Jose Ignacio Cabrujas, pelo grupo O Dromedário Loquaz, eu tinha que me despir (literalmente) de um personagem para assumir a figura do Leão de Castela. O tempo para a troca de figurino era curto e numa determinada apresentação, até hoje não sei porque, a calça que compunha o figurino estava virada e eu não consegui vesti-la. Não houve solução, tive que entrar em cena somente com a juba do leão e de cuecas”, lembra. Ele também vivenciou momentos mais delicados, como no tempo da Ditadura Militar. “Tínhamos que submeter o texto à prévia liberação pela censura. Inicialmente o texto era “julgado” em Brasília que emitia o atestado de liberação e determinava cortes a seu juízo. Depois, localmente, éramos obrigados a efetuar um ensaio para os “censores” (qualquer funcionário da polícia federal) para então termos o direito de estreia”, revive.
Édio segue firme. Atualmente ele trabalha em dois trabalhos do Grupo Armação: Armação em 2 Tempos, do qual fazem parte o monólogo Eu Confesso! e o drama Flores de Inverno, e o espetáculo de comédia de Odir Ramos da Costa Sopros de Paz e Guerra, recentemente estreado. Ele concluiu recentemente a participação no curta de animação Almofada de Penas, que está em fase final de elaboração, e também integra o elenco de uma webserie intitulada A Detetive da Vila do Corvo que será rodada brevemente na Ilha.
“O teatro na realidade não foi uma escolha. Ele aconteceu na minha vida de uma maneira nada glamurosa”, resume. “Através do teatro, ou a partir dele, eu valorizei as diferenças e perdi preconceitos. Aprendi a considerar mais o coletivo em detrimento do individual”, revela. São valores fundamentais como a disciplina e a perseverança, que estão presentes sempre em cada projeto que desenvolve, que Édio procura trazer para a vida.
